quinta-feira, 23 de novembro de 2017

GUERRAS DO ALECRIM E MANJERONA - centro cívico de Palmeira - 10º aniversário




A Nova Comédia Bracarense apresentou a peça GUERRAS DO ALECRIM E MANJERONA de António José da Silva (o judeu), no centro cívico de Palmeira, no contexto do 10 Aniversário do centro cívico de Palmeira e Festival de Outono promovido pelo INATEL. A encenação é da responsabilidade de José Manuel Barros.

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

1º Concurso Literário Edições Vieira da Silva


Dois contos pícaros da minha autoria publicados neste livro comemorativo do 1º Concurso Literário Edições Vieira da Silva

O MANEQUIM DA SENHORA CLOTILDE
CABRITO ASSADO NO FORNO

«Eram dez horas da manhã quando a notícia correu aos quatro ventos de boca em boca. Lopes, o encarregado-geral da empreitada, havia informado um dos operários que o engenheiro da Câmara oferecia um cabrito assado no forno, no Alívio dos Mortais, caso terminassem a obra naquele dia.
            - Quem paga? – perguntou um dos calceteiros.
            - O engenheiro Morais ou a Câmara Municipal, que interessa!
            - Quem é o engenheiro Morais?! – volveu o homem na sua ignorância.
            - É um novato que chegou aí há instantes a mando da Câmara. Quer mostrar serviço ao superior. Rapazes, é um quilómetro de estrada! Tem de ficar pronto antes de escurecer.
            Feito o acordo, os homens deitaram mãos à obra. Com efeito, ao meio-dia em ponto, tinham empedrado quinhentos metros de estrada. Um feito extraordinário! Nunca em Portugal até àquela data se trabalhou tanto e em tão pouco tempo.
Entraram no restaurante. Eram doze homens para encher uma mesa comprida.
- Este cabrito merece ser regado com um bom vinho! – atirou o engenheiro Morais.
            - Borba! – exclamou Lopes, de pronto.
Comeu-se e bebeu-se ainda melhor. A conversa enveredou para o futebol. Quando lhe perguntaram quem iria ser o novo campeão, o engenheiro Morais não teve dúvidas:
            - O Belenenses!
            A tirada provocou um banho de riso entre os calceteiros e pedreiros.
            - Quem é o senhor Morais? – interrompeu o servente.
            - Eu mesmo! – respondeu.
            - Está um senhor ao telefone. Deseja falar consigo, urgentemente.
E voltou dali a pouco à mesa, mas com o semblante carregado.
            - Então Sr. Morais? – perguntou Lopes, preocupado.
- Recebi uma chamada da Câmara.
           - Não se preocupe, Sr. Morais! – exclamou Lopes. – Vá lá à sua vida que nós cá nos arranjamos.
            E partiu. Vieram as sobremesas para cima da mesa e um cheirinho de aguardente para quem quisesse. Quiseram todos.   
            - É por conta do engenheiro Morais – disse Lopes.
            - Qual engenheiro?! – perguntou o dono do restaurante.
            Lopes telefonou de imediato para a Câmara. Não havia nenhum engenheiro com o nome Morais. Quanto à obra, escusado será de dizer que não ficou pronta nesse fim de tarde. Foram precisos mais dois dias para que o troço estivesse finalmente operacional. Mas nem tudo foi mau. Nesse ano, o Belenenses foi mesmo campeão de Portugal!» 
                                                                                                      
                                                                                      Cabrito assado no forno

«Era uma vez um rapaz conhecido na freguesia pelo «Funga», mas o seu verdadeiro nome era Amaral. Havia quem o apelidasse de Al Pacino, o ator da Hollywood, devido às parecenças na fisionomia. Usava jaqueta preta de cabedal puído, calça de ganga preta, t-shirt preta, sapatilhas All Star pretas. Ganhou a alcunha por causa do pó branco que snifava desde os quinze anos. Quando o produto faltava, Amaral furtava uns quantos rádios. Os episódios sucediam, mas nem sempre o Funga era responsável pelos roubos. Muitas vezes pagava o preço pela fama sem tirar o proveito, acabando na prisão. De cacete em punho, o guarda Sebastião recomeçava mais uma vez o interrogatório:
            - Diz-me lá, ó Funga! O que te deu na mioleira para fazeres aquela gracinha à senhora Clotilde?!
            - Por favor, não me bata, Sr. Sebastião! Fui eu! Fui eu! – suplicava Amaral quase a choramingar.
            - Isso já nós sabemos! – exclamava o guarda Sebastião, desferindo uma valente bastonada no lombo do prevaricador. – É preciso ter muita lata para roubar o casaco à senhora Clotilde e a seguir andar a exibir-se na rua à vista de todos!
            - Tinha frio, Sr. Sebastião – dizia o bardino, gemendo de dor.
            - Ai sim? – Sorria o guarda, apalpando o cacete. – Tenho aqui uma coisa que vai aquecer o lombo! – E o Funga levava mais duas bastonadas nos costados que é para aprender a não mentir.
No dia seguinte, a senhora Clotilde recebeu das mãos do guarda o casaco que lhe pertencia por direito.
            - Fique descansada que o ladrão está na prisão. Pode voltar a pôr a sua peça na montra.
            - Obrigada, senhor Sebastião. Posso fazer-lhe um desconto – acudiu, piscando o olho ao guarda nacional republicano.
            - Agradecido, mas não faz o meu estilo. 
            - Que pena! Ficava tão bonito dentro dele.
Passaram-se três meses. Um novo escândalo rebentou na aldeia, provocando a indignação entre os habitantes. O casaco da loja da senhora Clotilde voltara a desaparecer e, para cúmulo dos cúmulos, o boneco tinha sido profanado. Em letras garrafais podia-se ler no peito do manequim o seguinte trecho escabroso:
            «O guarda Sebastião anda a comer a senhora Clotilde.»
            E no baixo-ventre do modelo, dois rolos de lã, um verde e outro vermelho, pendurados ostensivamente entre as pernas do manequim. No meio, uma gravata amarela a combinar com as cores da bandeira nacional portuguesa.» 

                                                                                   O manequim da Senhora Clotilde 

terça-feira, 26 de setembro de 2017

GUERRAS DO ALECRIM E MANJERONA - Museu dos Biscainhos (BRAGA BARROCA 2017)

















Guerras do Alecrim e Manjerona é uma ópera joco-séria da autoria de António José da Silva (O Judeu), apresentada no Teatro do Bairro Alto em 1737. Trata-se de uma peça escrita em prosa, intercalando textos poéticos. As suas obras, em geral, rompem com os modelos clássicos, procurando inspirar-se no espírito e linguagem do povo, em que o canto e a música surgem como elementos essenciais do espetáculo.
Sendo assim, a intriga desta peça gira em torno de uma disputa estabelecida entre dois ranchos que têm como símbolos o Alecrim e a Manjerona. A ação principia em plena época carnavalesca, colocando em confronto os protagonistas dos dois ranchos. De um lado, D. Fuas, que pretende assegurar a mão de D. Nise; do outro lado, D. Gilvaz, que deseja conquistar o coração de D. Clóris. Para tal, os dois fidalgos pelintras contam com o engenho e a arte do gracioso Semicúpio (criado de D. Gilvaz) para levar a cabo os seus intentos. Contudo, as sobrinhas do velho avarento D. Lancerote estão prometidas, pelo menos uma delas, ao primo D. Tibúrcio, um morgado rústico que pelas maneiras e linguagem não colhe os favores das pretendentes. Entre encontros e desencontros amorosos, a peça vai-se desenrolando em palco, cheia de graça e humor, até terminar com um inesperado final feliz, cujas personagens Sevadilha (criada de D. Lancerote) e Semicúpio assumem um papel crucial na condução dos acontecimentos e desfecho das relações, já que também elas são movidas por interesses amorosos.  Numa época em que o teatro popular assume uma importância relevante no contexto da crítica social, o texto de António José da Silva pretende denunciar acima de tudo o namoro convencional tão comum praticado no seio das classes superiores (a nobreza e fidalguia decadente), assim como a medicina balofa, carregada de preciosismos latinos e linguagem oca, para além dos vícios e costumes das donzelas e cavalheiros que viam no casamento por interesse uma forma de assegurar a sua sobrevivência. Através de um discurso marcadamente irónico com forte pendor crítico, a peça exibi magistralmente algumas virtudes e defeitos das suas personagens, expondo a ridículo o seu comportamento imoral, com destaque para situações em que o ser e o parecer servem de pretexto para desencadear o cómico e o riso no espectador.
É neste ambiente de farsa, repleto de jogos de engano, disfarce e mal-entendidos, que esta comédia adaptada a partir do texto original do autor sobe ao palco sob a responsabilidade da Nova Comédia Bracarense, procurando uma vez mais, no seu repertório já tão vasto, ir ao encontro do teatro sob a influência da Commedia dell’arte, não só para homenagear um dos vultos maiores da dramaturgia portuguesa, mas também recuperar a melhor tradição do Teatro barroco.
Encenador: José Manuel Barros


D. Gilvaz………Agostinho Couto
D.Fuas…………António Pimentel
D. Tibúrcio…..Diamantino Esperança
D. Lancerote………Vasco Oliveira 
Sevadilha….........Helena Machado
Semicúpio……………Joshua Swift
D. Clóris…………………Helena Guimarães
D. Nise….Rita Pereira/ Sofia Tenreiro

Luz e Som…………Francisca Barbosa
Direção artística……………Carlos Barbosa
Encenação………José Manuel Barros
Figurinos……………Goreti Abreu
Produção……………NCB 2017